
Ana Silvia Alves Borgo¹
Sendo bem-sucedidos na sociedade e no trabalho, os normopatas se ajustam bem ao conformismo, como um uniforme, portanto, carecem de originalidade, de personalidade [i].
Segundo Duarte e Mendes, este conceito tem origem, citando Schotte (1986) e Mac Dougall (1982), “no estudo de psicopatologistas […]” para “[…] designar certas personalidades que se caracterizam, por sua extrema ‘normalidade’, no sentido de conformismo com as normas de comportamento social e profissional”[ii], os autores acrescentam, que o normopata é imune à culpa e não apresenta o sentimento de compaixão, não se indigna diante de situações de violência, injustiças, perversidades, ou seja, que geram sofrimento a outros. Bem como, não vivencia sofrimento e nem somatizações.
O normopata, não entra em contato com a sua subjetividade, não reflete sobre seus sentimentos e ações e não investe afetivamente nas relações, sendo indiferente ao outro. Ao contrário do psicopata, que nega a realidade externa, o normopata nega sua realidade interna, comprometendo sua imaginação e criatividade. Assume uma postura disciplinada, subserviente, e frases como: “sempre foi assim”, “se não fizer, outro fará” ou “todo mundo faz”, são comuns em suas interações sociais. Apresenta uma atitude que não enfrenta e nem confronta a realidade, dando consentimento, participando e colaborando com o mal, a injustiça, sem mobilização individual ou coletiva[iii].
A normopatia foi conceitualizada, acima, numa perspectiva individual, definindo traços de personalidade e de comportamentos. Na perspectiva da psicodinâmica do trabalho, Dejours[iv] contribui para o entendimento da normopatia relacionando a estratégia defensiva contra o sofrimento e conclui, que “o comportamento normopático pode resultar de uma estratégia defensiva e não da organização estrutural da personalidade. Ele pode ser convocado a pretexto de ‘estratégia individual de defesa’ […] para se adaptar ao sofrimento”.
Para o autor o oficial nazista Eichmann, nesta perspectiva, possuia uma personalidade normopática e atribui ao medo de um risco externo de precarização, de ser subjulgado pelo grupo e ser excluido socialmente, o fato de se submeter e executar o que lhe era designado, como: assassinatos em massa. Citando o conceito de “banalidade do mal” de Hannah Arendt, Dejours[v] define este processo como banalização. E acrescenta:
A banalização do mal não começa por impulsos psicológicos. Começa pela manipulação política da ameaça de precarização e exclusão social. Os impulsos psicológicos defensivos são secundários e são mobilizados por sujeitos que procuram lutar contra seu próprio sofrimento: o medo que sentem, sob o efeito dessa ameaça.
O autor apresenta o termo “consciência moral retraída”, que é gerada pela divisão social do trabalho e leva o indivíduo a ter um retraimento da consciência do que faz da sua responsabilidade e das consequências morais, principalmente nas relações em que há um distanciamento psicoafetivo. Acrescenta que a divisão :as tarefas leva ao “retraimento da consciência intersubjetiva setorial e, por fim, para a ignorância que confere ‘inocência’ e serenidade”[vi].
Diante dos conceitos apresentados, anteriormente, pode-se hipotetizar que a construção de um Coletivo de Trabalho com relações psicoafetivas de cooperação, confiança e solidariedade, contribuirá para a ausência de comportamentos normopatas.
Saiba mais acessando a dissertação:
BORGO, Ana Silvia Alves. Os efeitos da interação com a organização-cliente, na subjetividade do consultor organizacional. Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, 2018.
Referências:
[i] DUARTE, F.S.; MENDES, A.M. Normopatia. In: MENDES, A.M.; MERLO, A.R.C.; VIEIRA, F.O. (Orgs.) Dicionário Crítico de Gestão e Psicodinâmica do Trabalho. Coordenadora: Ana Magnólia Mendes. Curitiba: Juruá Editora, 2013, p. 263.
[ii] Idem item i.
[iii] DUARTE, F.S.; MENDES, A.M. Normopatia. In: MENDES, A.M.; MERLO, A.R.C.; VIEIRA, F.O. (Orgs.) Dicionário Crítico de Gestão e Psicodinâmica do Trabalho. Coordenadora: Ana Magnólia Mendes. Curitiba: Juruá Editora, 2013.
[iv] DEJOURS, C. A banalização da injustiça social. Tradução: Luiz Alberto Monjardim. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007, p. 118.
[v] Idem item iv, p. 119.
[vi] Idem item iv, p. 120.
¹Mestre em Administração pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).
Como citar:
BORGO, Ana Silvia Alves. Normopatia: sintoma da manipulação política da ameaça de precarização e exclusão social. In: Nuevo Blog, 22 mar. 2021. Disponível em: https://nuevoblog.com/2021/03/22/normopatia-sintoma-da-manipulacao-politica-da-ameaca-de-precarizacao-e-exclusao-social/ . Acesso em: ??
Deixe um comentário